17/09/2022

Uma mente que brilha

 Eliani Gracez - Psicanalista


Em virtude da negatividade do cérebro, é preciso um empenho ativo para interiorizar as experiências positivas e cicatrizar as negativas. Tender para o que é positivo, é na verdade, a correção de um desequilíbrio neurológico. E proporciona toda a atenção e o incentivo que deveria ter recebido na infância (Rick Hanson com Richard Mendius). No significado da palavra sofrimento está contido angústia, frustração, estresse profundo. Nesse sentido, a neurociência faz duas perguntas: Que condições cerebrais são propicias a felicidade, amor e sabedoria? Como é possível usar a mente para estimular estados mentais positivos? Os estados mentais influenciam no cérebro e na liberação de hormônios. Assim como um salto de paraquedas leva o cérebro a fazer sinapse e a liberar adrenalina, outros estados mentais influenciam no cérebro que liberam, por exemplo, serotonina, endorfina, oxitocina, dopamina, hormônios popularmente chamados de hormônios da felicidade e do prazer. Liberados na corrente sanguínea regulam nosso humor, temos assim uma circularidade, pois com o “bom humor” liberamos hormônios da felicidade e do prazer, hormônios liberados mantemos o “bom humor”. As emoções interagem com o cérebro, que interage com o corpo, que interage com o mundo. Temos então um sistema codependente. Quando o sofrimento se apresenta, muitas vezes desde a infância, temos, a grosso modo, sinapses que em nada contribuem a liberação de hormônios da felicidade e do prazer. O corpo somatiza, a depressão se instala, e por vezes a ansiedade generalizada torna-se inevitável. Provavelmente aprendemos mais sobre o cérebro nos últimos vinte anos do que toda história documentada (Alan Leshner). O desvendar da mente e do cérebro, proporcionou mais ferramentas para uma vida feliz, sobre tudo no campo da terapia. Uma mente que desperta é um cérebro que desperta para novas sinapses, isso porque se descobriu a plasticidade do cérebro que pode perfazer outros caminhos, saindo da mesmice. 

11/06/2021

Medo do Poder

 Eliani Gracez - Psicanalista



Tememos o poder e por isso nos sabotamos. Estamos tão acostumados a uma vida medíocre que não sabemos viver de outra forma e não sabemos o que fazer com o poder que cada pessoa tem e por isso nos sabotamos e desenvolvemos resistência ao nosso crescimento. Confundimos humildade com ausência de poder. Nietzsche já alertava que a moral do fraco é a moral vencedora, nesse planeta. Como existe uma moral enraizada em nós que diz que temos que ser humildes, consideramos nossa potência um erro. Poder é potência, mas onde está o nosso potencial? Na potência reside nossa sabedoria. O fenômeno da resistência tem sido observado desde os primórdios da psicanálise e continua sendo considerado a pedra angular na prática analítica. Motivo pelo qual, a resistência ainda continua sendo estudada em seus mais variados prismas. A concepção de resistência surgiu quando Freud começou a trabalhar com as lembranças “esquecidas” de suas pacientes histéricas, até então a resistência era vista como um obstáculo à análise. Em A Interpretação dos sonhos, os conceitos de resistência e censura estão relacionados, e tudo o que interrompe o progresso da análise é resistência. Aos poucos Freud entendeu que a resistência não estava somente naquilo que estava sendo reprimido em sonhos, mas também nos impulsos de origem sexual. E assim o conceito de resistência, aos poucos, foi ampliado para resistências em Inibição e em angústia. A resistência pode ser consciente ou inconsciente, segundo Zimerman, Manual de técnica psicanalista, página 97, ela sempre provém do ego, ainda que tenha outras influências da psique. A resistência pode se expressar pelas emoções, atitudes, ideias, impulsos, fantasias, linguagem, somatizações ou ações. Nesse sentido todo aspecto da vida mental pode estar relacionado a resistência. Por este motivo as resistências podem ser complexas e se apresentar de variadas maneiras tais como: faltas, atrasos, intelectualizações, exagero de silêncio, sonolência, entre outros. Pode-se também relacionar a resistência à patologia que lhe deram origem. Teríamos, nesse caso, resistência do tipo Narcísica, esquizoparanóide, maníaca, fóbicas, obsessivas etc. Também é útil considerar resistências relacionadas ao desenvolvimento emocional primitivo, entre estas o narcisismo é, particularmente, importante por se constituir no cerne da formação da personalidade e da identidade na mais tenra idade. Mãe e bebê reproduzem uma simbiose original, uma situação psíquica onde persiste um forte grau de fusão, uma não diferenciação um do outro. Quando o bebê sai da fase simbiótica, ele inicia a fase de separação e diferenciação do eu com relação ao outro. Uma diferenciação entre o bebê e sua mãe. Desta forma se dá o nascimento psicológico da criança. Enquanto a criança permanecer nesse estado simbiótico com sua mãe ele não diferenciará o eu do não eu. Neste caso a criança desenvolve uma crença ilusória e onipotente de que possui independência absoluta. Na fase simbiótica o bebê acredita que os atos de sua mãe são os seus atos, e que cada obra de sua mãe é fruto do seu desejo. E assim se forma no bebê a ilusão de que todos estão ali para ele e somente para ele. Uma ilusão se forma onde o bebê é a majestade e os outros seus súditos. Essa onipotência, em muitos casos, permanece até a fase adulta, onde as pessoas que rodeiam a pessoa onipotente estão ali para servi-la. E assim se dá o relacionamento com o mundo exterior. A não aceitação da diferenciação leva a um estado de resistência em aceitar a singularidade entre as pessoas, e a um estado de incompletude. Freud aprofundou com o tempo o estudo sobre as resistências, sobretudo a resistência e sua associação com o ego. O ego é o responsável pelo contato do psiquismo com o mundo real exterior ao indivíduo. Ele atua de acordo com o mundo exterior da pessoa, estabelecendo uma ligação entre as demandas do inconsciente e o superego. Estão no ego as percepções, sentimentos, memória e os pensamentos. Por outro lado, o Superego está relacionado as normas e valores imposto pela família, religião, moral social etc. O superego se forma durante a fase fálica, onde a criança começa a internalizar os valores e as normas sociais. O superego nos diz o que é certo e o que é errado, o que é proibido e o que é permitido. E assim os impulsos do inconsciente começam a ser inibidos. Impulsos são liberados do inconsciente e a pessoa sente, por exemplo, uma determinada vontade, mas o superego julgar aquela vontade imoral e por isso reprime. Formando assim resistências e sabotagens.





18/09/2020

O Poder diz quem manda e quem obedece


 Eliani Gracez

Quando se reflete sobre algo multifacetado como o poder em uma sociedade, a primeira coisa a se verificar são suas instituições. Nas instituições o poder é sacramentado, mesmo sendo uma instituição de caridade. É o poder que irá nos dizer quem manda e quem obedece, quem receberá ajuda e quem será abandonado.  A verdadeira corrupção acontece quando são privatizadas as riquezas que deveriam ser de todos e não somente de alguns, e em nome de um inexpressivo e ilusório crescimento. Assim, as verdadeiras elites aparecem, aquela desenvolvida dentro do Estado e detentora do poder, e aquela que vem de fora e interfere nas relações dentro do Estado. Temos então uma elite poderosa e uma ameaça invisível à igualdade social. A elite que vem de fora imbeciliza a elite do Estado, pois saqueia o verdadeiro poder, as riquezas naturais do Estado. Esse espólio é legitimado pelo pensamento de que ao vender uma instituição que sofreu corrupção pelos seus membros, a corrupção possa acabar. Sendo que a maior de todas as corrupções acontece quando uma elite manipula a riqueza deixando o resto na pobreza, dividindo em dois polos e dando origem ao preconceito. Um extermínio semelhante ao de Auschwitz, porém agora sem grades tem início, deixando de fora das riquezas naturais àqueles que legitimamente são seus donos, o povo. Nessa tarefa de espólio da sociedade, não podemos deixar de apontar a culpa de intelectuais que só porque leram uma, duas ou mais bibliotecas inteiras, se acham no direito de legitimar sua pseudociência. Não existe conhecimento que não passe pela experiência, portanto, não adianta decorar centenas de livros se o intelectual de gabinete não passou pela luta da sobrevivência diária pela qual passa o povo. Sem a experiência o conhecimento se esvai e a idiotização toma conta, e pseudocientistas afloram.

01/09/2019

SOBRE O SILÊNCIO DOS HOMENS

Eliani Gracez

A identidade masculina foi forjada em cima da crença de que a força física daria ao homem o poder, e de posse do poder o homem dominaria o planeta a qualquer preço. O macho, predominante da espécie, tornou-se um dominador e predador, recalcando, desde a infância, seus sentimentos. Segundo Ismael dos Anjos no documentário O silêncio dos homens, o homem usa da violência como linguagem, esse tem sido o referencial de homem. Tem pelo menos 100 anos que a mulher aprendeu a se organizar e ir à luta contra a dominação masculina, as sufragistas mostraram ao mundo feminino que o predador não é tão forte assim. Daquela época até hoje, a delicada mulher, porém, nem por isso com menos força, tem penetrado no mundo do poder que antes pertencia somente aos machos alfas da espécie, causando uma crise existencial no homem que retorna ao berço da filosofia com a pergunta, quem somos nós? O homem sentindo que está perdendo seu espaço usa do referencial de macho, a força bruta para não perder o poder. Chama nossa atenção ainda, a existência do que hoje se chama de feminicídio e violência doméstica, embora tenha sempre existido, demonstra a falta de evolução do homem. Em tempos pós-modernos toda essa brutalidade já deveria ter sido solucionada, e o homem poderia ser um homem superior ao homem que anda sobre o planeta.

06/11/2018

AS REPRESENTAÇÕES

Eliani Gracez


         Cada pessoa forma sua visão de mundo a partir de suas representações, essas representações acontecem no tempo e no espaço. Tanto para Schopenhauer quanto para Kant, a intuição envolve espaço e tempo. A intuição faz parte da experiência em perfeita harmonia com suas leis, o sentido externo é próprio ao espírito do homem, e assim os objetos que são representados estão lançados no espaço. Existe, nesse sentido, uma relação do interno com o externo através do tempo e do espaço. Esta relação são modos e funções do sujeito, formas puras da intuição e princípio do conhecimento. O espaço tem sua representação não a partir do fenômeno, mas sim mediante existência a priori sendo ele forma da intuição e não coisa em si. Schopenhauer considera tempo e espaço como algo intuído vazio de conteúdo, uma representação que existe por si mesma. O espaço é efetivação da matéria onde se manifesta a relação entre os corpos, onde o fazer efeito é sua essência. A matéria é efetividade ou causalidade e essa efetivação no espaço está no cérebro. É assim que todos os fenômenos podem existir no espaço infinito. O tempo é uma sucessão de aniquilamento do momento anterior, a morte do que passou para se depositar o presente, por sua vez, o presente também morre para que novamente algo seja depositado em seu lugar, uma sucessão de colocar, aniquilar e colocar de novo; e o presente é um intermediário entre o passado e o futuro, mas tudo será igualmente aniquilado na sucessão do tempo, até mesmo o futuro.
         O O presente impõe o fim do momento anterior. Nesse sentido, pode se dizer que o presente extermina aquilo que já foi presente um dia, até mesmo o futuro deixará de ser, não existindo mais a eternidade, e sim o limite e o fim. No tempo são depositadas as representações que serão substituídas por outras representações, desta forma o tempo determina a finitude da representação, pois o que agora é, em instantes deixará de ser. O tempo é sucessão. Schopenhauer quer demonstrar a nulidade de tudo o que acontece no espaço e no tempo, até mesmo as representações são finitas, pois é possível substituí-las por novas representações. Com isso ele demonstra a instabilidade de todo conhecimento representativo, inclusive o conhecimento científico.
Pensando assim, Schopenhauer, através da sucessão, deu ao tempo caráter de infinitude. tempo é um eterno deixar de ser e, portanto, nulo, algo imaginário. Uma forma de apreensão do sujeito para a medida dos movimentos. Até mesmo as representações são finitas no tempo, dando assim instabilidade ao conhecimento, pois é possível substituí-las por novas representações. Também os conceitos são representações abstratas finitas no tempo e no espaço. Para ser mais exato, causa e motivo estão intimamente relacionados às representações no tempo, possuindo existência relativa um para o outro, o mesmo acontece com sujeito e objeto que tem sua existência um para o outro, pois um é a causa do outro. Um fluir incessante, um devir no mundo da possibilidade, onde cada ser representa seu próprio mundo a partir de conceitos instáveis.
Mas tempo e espaço não estão separados, não sobrevive cada um por si, na união de ambos reside sua essência: no fazer-efeito ou na causalidade. Todos os fenômenos no tempo e no espaço adquirem, com isso, caráter inumerável, e sem limite. ― Inumeráveis finitos compondo o infinito. Esta é a essência da matéria, fazer-efeito. Uma relação de causa e motivo que Schopenhauer também chama de causalidade e que está relacionada ao princípio de razão suficiente do devir. Existe, para a matéria, uma relação necessária entre espaço e tempo, por isso eles são a essência da matéria, não podendo existir por si, mas sim um para o outro.
Tudo isso deve ser estudado à luz do entendimento que nada mais é do que a capacidade de ordenar, unificar e fazer síntese para conhecer a causalidade, estabelecendo assim novas relações de causa e efeito. Se toda matéria, ou fenômeno, está no tempo e no espaço, e da relação necessária entre eles surge à causalidade que deve ser estudada pelo entendimento, então toda matéria deve ser estudada também pelo entendimento. Pois da relação da matéria com o espaço/tempo surge à causalidade que é estudada a luz do entendimento. Schopenhauer diferencia razão e entendimento, o princípio de razão está sujeito a sucessão que o tempo impõe, tendo por única função elaborar conceitos e representações abstratas, por esse motivo não pode fornecer um conhecimento absoluto, mas sim relativo a causa e ao efeito. A função do entendimento é o conhecimento imediato pela relação de causa e efeito.